quarta-feira, setembro 24, 2014

A Igreja

     Tem uma igreja no centro da cidade camuflada entre sobrados residenciais. Sua cor é de um rosa desbotado, ajudando ainda mais na sua discrição. Mas do lado de dentro o teto é muito alto e provoca uma acústica que, combinada com o piso de pedra, faz tudo ecoar de forma grandiosa. Dona Bilola gosta de colocar sapatos de salto para ir na igreja, porque se sente poderosa de alguma estranha forma quando ouve o som que seus passos produzem. Dona Elena pensa nisso como um desrespeito à sagrada casa de Deus, preferindo o total silêncio de suas solas baixas. Já o Padre Ermírio sente uma satisfação enorme ao ouvir o zunido das vozes dos fieis aumentado pela acústica peculiar. Foi por isso mesmo que decidiu formar um coral de crianças, para deleite de seus ouvidos – e das carolas.
     Mas é durante a noite que a igrejinha ganha seu tom mais peculiar e sombrio. O padre, que mora na casinha dos fundos, se pela de medo de ter de pisar na nave sagrada depois das 22:00. As estátuas de santos ganham tamanhos inimagináveis nas sombras formadas pela luz alaranjada dos postes que entra pelos vitrais pequenos e verticais. Dona Aracy, da limpeza, teria muito medo só de imaginar-se dentro da igreja durante a noite. Mas ama ouvir o som dos passarinhos ecoando pelas paredes do lugar de manhã cedinho.

     De dia ela é sagrada e de noite mal assombrada!

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